30/11/2014

APÁTRIDA

Apátrida
 
 
Queria dizer bandeira, pátria, mas sinto-me
foragido num qualquer lugar fora do berço,
onde não descanso os braços na ausência
de uma canção de embalar caída no chão,
ao abandono no peito, zangado e só.
 
Como tronco ressequido sobre o cume,
as minhas raízes quedaram-se nos gestos
empedrados do desalento profundo,
estagnaram sobre as telhas das manhãs
nascidas para nada acontecer.
 
Não há poema que seja símbolo ou flor
que seja dádiva. Estou só, porque quero
sentir os vendavais tardios e imprevistos,
manifestar-se nos flancos da terra árida
com sons primordiais de esperança e medo.
 
Pertenço aos que gritam no deserto
em busca de um fragmento novo, duma pinga
de água a abrir carreiros sobre os catos,
resistentes aos temporais de areias
e às miragens dos horizontes belos.
 
Há-de nascer o dia dos oásis serpenteados
de água fresca e brilho das palmeiras
verticais ao céu. Vai ser o dia de erguer
o estandarte guardado em mim. Canção
com pétalas vermelhas e sabor a abril.
 
ADELAIDE CARVALHO *
 
(*POETA VIMARANENSE, SÉC.XXI)
 

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